Compartilhamento semanal #4: O Prazer de Estar Errado [fase de pesquisa]

Alex Bretas
6 min readNov 27, 2020

--

Este é o compartilhamento semanal #4 da pesquisa do livro O Prazer de Estar Errado.

A ideia é ir fazendo pequenos sprints semanais de pesquisa e trazer pra cá as principais pérolas e reflexões.

Para saber mais sobre o projeto, clique aqui.

E, para se juntar ao grupo de leitores beta no Telegram, clique aqui.

O que eu pesquisei durante a semana?

Nesta semana, comecei a adotar uma tática inusitada. É comum que toda semana eu faça algumas conversas online com pessoas pelo simples prazer de me conectar com elas. Algumas querem me apresentar algo que realizaram, outras desejam apoio para seus projetos e outras ainda só querem trocar ideias.

Dado que as entrevistas têm sido muito reveladores como ferramentas de pesquisa, resolvi entrevistar algumas dessas pessoas durante essas reuniões. Isso tem me permitido garimpar não apenas visões diversas sobre os temas conectados ao erro, como também histórias e “causos” muito vivos a respeito do assunto.

As mensagens que tenho recebido no grupo de leitores beta no Telegram também estão sendo muito ricas. Salvei algumas delas no meu repositório de pesquisa, inclusive. Agradeço muito a quem está participando por lá!

Além disso, assisti alguns vídeos e li artigos sobre complexidade, pensamento sistêmico, estilos de pensamento e perfeccionismo.

As 3 fontes mais interessantes que encontrei

How to get over ‘never good enough’

(Margaret Rutherford — PSYCHE)

Este artigo trata da questão do perfeccionismo enquadrando-o como uma “depressão silenciosa”. Existem, para a autora, o perfeccionismo construtivo e o destrutivo, e sua análise recai sobre os efeitos do segundo e como podemos nos livrar dele com exercícios práticos.

Entrevista com Marcos Flores

O Marcos é um antigo colega de projetos de facilitação que, mais recentemente, tem se especializado em pensamento sistêmico e complexidade. O papo com ele foi importante para abrir mais “janelas” de contexto sobre o erro — ou seja, como podemos percebê-lo a partir das lentes do diálogo, da experiência, do aprendizado e da cognição.

Entrevista com Gabriela Imbernom

A Gabriela — Gábi para os íntimos — é gerente pedagógica de uma empresa de consultoria linguística e foi uma das participantes da comunidade do MoL. Aproveitei a oportunidade da nossa conversa para entrevistá-la sobre como ela percebe as questões relacionadas ao erro no contexto do seu trabalho e da aprendizagem de idiomas.

Principais reflexões e insights

  • “Perfeccionistas construtivos, digamos que sejam nadadores, querem bater o seu melhor. Isso traz consigo todos os tipos de vibrações positivas. Ganhar a corrida é ótimo, se é que eles ganham. Mas perfeccionistas destrutivos querem ser o nadador perfeito. E vencer todas as corridas é o objetivo; do contrário, a vergonha lhes diz que têm pouco ou nenhum valor”. (How to get over ‘not good enough’)
  • Ironicamente, perfeccionistas destrutivos talvez nunca se percebam como perfeccionistas, uma vez que nunca sentem que fizeram um bom trabalho. Eles sempre têm um próximo objetivo — e um próximo medo de falhar — em mente.
  • Pessoas que não apresentam traços de depressão clássica podem estar escondendo uma maneira muito perfeccionista de encarar a vida, e isso pode ser entendido como uma espécie de “depressão perfeitamente escondida” segundo Margaret Rutherford. Tal perfeccionismo gera sofrimento especialmente na forma de ansiedade.
  • O perfeccionismo está fundado em um profundo medo de errar, impossibilitando a obtenção do “prazer de estar errado”
  • O antídoto para o perfeccionismo é a autoaceitação ou autocompaixão.
  • Distinção entre autoestima e autocompaixão segundo Kristen Neff: “é importante distinguir autocompaixão de autoestima. Autoestima se refere ao grau em que nos avaliamos positivamente. Representa o quanto gostamos ou valorizamos a nós mesmos e geralmente é baseado em comparações com outras pessoas. Em contraste, a autocompaixão não se baseia em julgamentos ou avaliações positivas, é uma forma de nos relacionarmos conosco. As pessoas sentem autocompaixão porque são seres humanos, não porque se veem como especiais ou acima da média. A autocompaixão enfatiza a interconexão ao invés da separação. Isso significa que, com autocompaixão, você não precisa se sentir melhor do que os outros para se sentir bem consigo mesmo. Ela também oferece mais estabilidade emocional do que autoestima, uma vez que está sempre lá para você — seja quando você está no topo do mundo, seja quando cai de cara no chão”.
  • Existem três tipos de perfeccionismo descritos na literatura que aborda o tema: perfeccionismo auto-orientado (exigir de si mesmo ao extremo); perfeccionismo orientado para os outros (esperar que os outros sejam perfeitos); e perfeccionismo prescrito socialmente (exigir de si mesmo o atendimento às altas expectativas de perfeição dos outros). O último tipo é o mais perigoso por causa de sua associação com pensamentos suicidas.
  • O “prazer de estar errado” também pode acontecer quando você se vê livre de ter que viver pelas expectativas de perfeição dos outros. É o famoso “ligar o foda-se” — que envolve a árdua tarefa de colocar limites na nossa relação com o outro.
  • O medo de errar geralmente é adquirido na infância, mas é na fase adulta que ele se apresenta como um aspecto fundante da nossa experiência subjetiva e social. (obrigado, MT!)
  • “O mundo que vemos não é o mundo, mas um mundo que demos luz com os outros” (Humberto Maturana). Neste sentido, podemos derivar que o erro que vemos não é o erro, mas um erro que demos luz com os outros por meio do nosso linguagear
  • Como o teatro — encarnar um personagem — poderia atenuar o medo de errar?
  • Para obter prazer de estar errado, seria necessário 1) permitir-se errar; 2) perceber e elaborar o erro; 3) tolerar ou “suportar” a vergonha e a irritação de errar; 4) aí sim, apreciar o erro e perceber quais coisas novas ele pode apontar.
  • O erro é, impreterivelmente, uma coisa nova em seu sistema de percepção. Algo que, uma vez percebido, mudará nossa existência no mundo. O erro é uma perturbação em algum de nossos sistemas de referências (que baseiam nossas expectativas). Podemos escolher mitigar o erro em si ou mudar nossa percepção sobre ele — é o que se coloca para nós diante do fenômeno da dissonância cognitiva. Às vezes, é melhor fazer o primeiro. Mas às vezes é importante ter coragem para fazer o segundo.
  • O erro é a brecha, a fresta que permite a luz entrar. (inspirado no Leonard Cohen)
  • “Quando a gente começa a conversar, nós iluminamos nossos pontos cegos cognitivos”.
  • O observador só sabe distinguir entre o real e a ilusão depois da experiência (Humberto Maturana). Ou seja: as pessoas, antes de perceberem um “erro”, vivem a experiência como real.
  • Em vez de olhar para o objeto “erro”, é preciso olhar para a experiência da pessoa.
  • Negligência x Experiência: dois modos distintos de operar a partir da interação com o outro. Eu posso negligenciar sua história, sua deriva, sua trajetória e culpá-lo por errar, ou eu posso escutar sua experiência e perceber como o “erro” para ela pode ser interpretado de maneira totalmente distinta
  • “O prazer de estar errado é o prazer de distinguir a experiência do outro”
  • “Temos uma crença instalada de que existe um mundo independente do observador”
  • “Quando eu faço, eu faço na crença de que está certo”
  • “As pessoas estão cheias de histórias que, para elas, se tornaram verdades”
  • Temos “um tanto de lugar que a gente não percebe que está percebendo o outro”
  • O erro está na “brecha”. O erro É a brecha.
  • Existe vida pulsando no erro, existe movimento, abertura, mudança.
  • “Não fez mais que sua obrigação”: uma frase quase onipresente na criação de muitas pessoas e que influencia diretamente no quanto elas, mais tarde, conseguirão tolerar o erro.
  • “Quando eu falo sobre os meus erros, a minha dor a partir disso, minhas histórias, eu abro espaço para que a minha equipe também possa se permitir errar, além de também compartilhar esses erros comigo”
  • “O trabalho que a gente mais faz hoje na empresa é lidar com os fatores emocionais relacionados ao aprendizado da língua”. Especialmente com o MEDO DE ERRAR.
  • “O medo de errar impede o desenvolvimento principalmente das habilidades de produção relacionadas ao idioma — escrever e falar”. Com medo de errar, eles não conseguem valorizar os pequenos progressos.

Semana que vem tem mais.

O livro O Prazer de Estar Errado está sendo escrito “em voz alta”. Isso significa que eu quero muito ouvir o que você pensa sobre tudo isso.

O que te toca nessas reflexões? O que você pensa ou sente sobre elas?

Entre no grupo no Telegram e participe da conversa!

Para saber mais sobre mim, acesse www.alexbretas.com.

--

--

Alex Bretas
Alex Bretas

Written by Alex Bretas

Alex Bretas é escritor, palestrante e fundador do Mol, a maior comunidade de aprendizagem autodirigida do Brasil. Saiba mais em www.alexbretas.com.

Responses (1)