Horizontes e Territórios: como ter um foco claro ao aprender
Em qualquer jornada de aprendizagem autodirigida, existe uma direção. Estamos indo a algum lugar, embora não saibamos exatamente para onde — se soubéssemos com precisão, não seria aprendizagem.
Pode ser que tenhamos uma ideia sobre esse lugar. Como ele se parece, quais são os cheiros, quem são as pessoas que estão lá… Ainda assim, é somente uma ideia.
Você já ficou bastante tempo olhando a linha do horizonte? Certa vez, em Fortaleza, fiquei várias horas olhando o horizonte deitado de frente para o mar.
É intrigante porque, por mais que caminhemos em direção ao horizonte, nós nunca conseguiremos “chegar”. Não há de se falar em “chegada” no caso de uma caminhada rumo ao horizonte.
A aprendizagem que eu acredito se comporta dessa mesma forma. Não existe uma linha de chegada. É infinita por definição.
Nós também não sabemos muito bem o que nos espera ao andar em direção ao horizonte. Dependendo da qualidade do nosso mapa, teremos mais ou menos pistas. Dependendo da qualidade da nossa atenção, nos encantaremos mais ou menos pelo caminho.
Ainda assim, mesmo sem sabermos o que esperar, o horizonte está lá, firme, intacto, nos deixando curiosos. Ele existe.
Nos últimos meses, venho criando um “método” para ajudar as pessoas com uma das inquietações mais frequentes no universo da aprendizagem autodirigida: como ter um foco claro? Como não se perder na vastidão de interesses, informações e distrações?
Um dos pilares desse método é o Horizonte que existe dentro de cada um.
Esse Horizonte não pode ser nomeado. No máximo, você pode se aproximar dele e lhe dar alguns apelidos. Mas nome mesmo, não.
O fato dele não poder ser nomeado significa que você nunca vai conhecê-lo completamente. Assim como a linha do horizonte que fiquei observando no mar de Fortaleza, ele carrega um tom intrínseco de mistério.
Ao longo dos anos, meu Horizonte me levou por diferentes Territórios: educação democrática, doutorado informal, desescolarização, escrita, aprendizagem autodirigida, aprendizagem ágil, cultura de aprendizagem, hábitos, marketing digital…
Caminhei um pouco por todos esses Territórios e outros mais. Com o tempo, fui descobrindo pontes e trilhas que os conectam de maneiras que eu nunca teria imaginado antes.
Durante todo o caminho, eu conseguia ver meu Horizonte, por mais que em alguns momentos só um pedacinho dele estivesse visível. Mas eu sabia que ele estava lá, firme, intacto, me fazendo companhia.
Uma das grandes maravilhas da aprendizagem autodirigida é ter a chance de viver e conectar diversos Territórios. Você não está preso a uma trilha única, pois existem várias delas, além daquelas que ainda não estão abertas e você pode criar.
O que conecta todos os seus Territórios, os que você já passou e os que ainda irá passar, é o seu Horizonte. Ele é a sua chama interna. É aquilo que te dá tesão de existir, que te orienta, mas não de uma forma racional. É o seu norte, sua bússola, sua fome de descoberta, Aquilo Que Importa — de “importar”, mesmo, no sentido de trazer pra dentro.
Não tente escrever seu Horizonte, nem defini-lo usando qualquer tipo de linguagem das palavras. No máximo, use apelidos momentâneos se assim o desejar, pois o Horizonte, assim como a chama, se move de maneiras imprevisíveis e, às vezes, surpreendentes.
O Horizonte escapa a qualquer definição racional, e é bom que seja assim. Ele é uma energia, um mantra, um amuleto, e quando ele se manifesta, nós podemos senti-lo como Entusiasmo, Vontade de Viver, de se jogar, pulsação.
É muito mais importante aprender a sentir o Horizonte do que defini-lo. Você já sentiu? Sabe do que eu estou falando?
Os Territórios, sim, são nomeáveis, e também é bom que seja assim. Precisamos descobrir (ou criar) os nomes dos Territórios pelos quais passamos para poder melhor nos orientar, e também para contar aos outros sobre eles.
“Educação democrática”, por exemplo, é um nome de Território. Sabendo como ele se chama, você consegue chegar até lá. Uma vez dentro dele, talvez você queira explorá-lo em mais detalhes, e aí você descobrirá outros nomes: “aprendizagem pluralista”, “Helena Singer”, “IDEC”, “Yaacov Hecht”, “AERO”, “área de crescimento”, “área de força” etc. Poderá descobrir, ainda, conexões entre esse Território e vários outros.
Dessa forma, os nomes dos Territórios funcionam como “senhas” para que você possa adentrá-los. Em cada um deles, com algum esforço e paciência, você pode encontrar tesouros.
Por algum tempo, eu acreditei em métodos para “organizar” jornadas de aprendizagem autodirigida em torno de focos nomeáveis e bem definidos. É o caso, por exemplo, da pergunta de aprendizagem.
Criar uma pergunta de aprendizagem que dê conta da sua investigação até pode ser um exercício interessante em certos momentos e para algumas pessoas.
Mas, muitas vezes, a pergunta simplesmente não dá conta. Pior: a pergunta pode “encapsular” a investigação. Pode te prender em uma bolha de racionalidade que te atrapalha a sentir seu Horizonte.
Quando propus às pessoas que criassem perguntas de aprendizagem, percebi em muitas delas uma ansiedade e até mesmo uma angústia. Elas queriam chegar na pergunta “certa”, na exata combinação de palavras sucedidas por uma interrogação.
Além disso, ficavam com frequência se perguntando se determinada coisa (Território) que queriam aprender estava “dentro” da sua pergunta.
Aprender de maneira autodirigida, pra mim, não é sobre isso, pelo contrário. É sobre libertar-se desse tipo de amarra.
É por isso que eu proponho, no caso da “técnica” dos Horizontes e Territórios, que o Horizonte não seja nomeado. Muitas vezes, as palavras atrapalham o sentir, a percepção sutil, o fluxo livre.
Deixe-se guiar pelos Territórios que o seu Horizonte quer te levar. E vá abrindo trilhas, criando pontes, encontrando outros exploradores, fazendo alianças e descobrindo seus tesouros. O que é tesouro pra você não necessariamente será para uma outra pessoa, e tudo bem.
O tesouro é seu, só seu, porque você é quem dá significado a ele.
O fato de eu não trabalhar mais com abordagens que tentam organizar a aprendizagem autodirigida em torno de um elemento racional (como a pergunta) não significa que eu não acredite no poder de se ter estratégias de mapeamento e organização ao longo da jornada.
No próximo post, pretendo escrever sobre isso a partir da história de João e Maria. Lembra das migalhas de pão que os faziam encontrar o caminho de casa?
E aí, o que você pensa sobre essa ideia dos Horizontes e Territórios? Faz sentido? Me diga nos comentários!