Dez chapéus do(a) educador(a) autodirigido

Alex Bretas
15 min readOct 23, 2018

Como educadores(as) informais, nosso papel é apoiar pessoas em suas aprendizagens. Não podemos fazer por elas, mas podemos fazer com elas. Mais que tudo, devemos aprender com elas. “Professor é aquele que ensina, educador é aquele que aprende”, já nos disse Tião Rocha.

Temos vários chapéus. Cada um está ligado a atitudes úteis para fomentar o desenvolvimento de percursos de aprendizagem livres.

1. Acendedor(a) de chamas

Atitudes fundamentais: inspirar, apreciar, celebrar

Fonte: pixabay.com.

Muitas pessoas tiveram seus desejos, sonhos e talentos apagados pela cultura patriarcal e autoritária, pelo processo de escolarização e pelo sistema capitalista que explora mão-de-obra. É difícil para algumas delas até mesmo saber quais temas e caminhos as interessam. Estão no piloto automático e confundem educação com ensino, aprender com ser ensinado.

Podemos apoiar essas pessoas por meio do nosso próprio exemplo de vida, que pode servir de inspiração para que elas despertem para suas potencialidades. Se eu me coloco constantemente na busca por aprender a partir do que faz sentido para mim, isso contagia quem está ao redor. Se eu busco adotar uma postura de abertura radical para o que emerge no aqui e agora, as pessoas são capazes de sentir e admirar isso. E vão querer experimentar também.

A apreciação também é importante e acontece toda vez que reconhecemos de maneira sincera as belezas e potências do(a) aprendiz. Para que uma pessoa passe a acreditar em si, é preciso antes que acreditem nela. O processo de “acreditação” é social. Nesse sentido, acender chamas também significa uma crença inabalável nas capacidades e aspirações de quem aprende. Como Paulo Freire gostava de dizer, é necessário “esperançar” junto, mesmo — e especialmente — em cenários adversos.

Celebrar aponta na mesma direção que apreciar, mas traz também um outro componente: reconhecer e festejar as conquistas. Cada pequena conquista em um processo de aprendizagem livre importa. Cada capítulo escrito, cada reflexão feita, cada acorde internalizado. A motivação cresce quando nos lembramos com frequência que estamos progredindo.

Para saber mais

  • Um dos princípios do Thinking Environment é a apreciação, e um bom artigo sobre o tema pode ser encontrado aqui.

2. Engenheiro(a) de pontes

Atitudes fundamentais: conectar, coviabilizar

Fonte: Jeff Nissen.

A aprendizagem é, via de regra, interativa. Mesmo quando aprendemos a partir de uma fonte secundária como um site ou um livro, alguém produziu essa fonte. Mesmo quando aprendemos a partir da observação de fenômenos, estamos interagindo com a realidade, o que implica dizer que a recriamos sempre com o nosso olhar. Quanto mais conectados estivermos com fontes de aprendizado, mais chances temos de construir entendimentos inovadores. Aprender é sexo de ideias.

Eu e Conrado Schlochauer desenvolvemos uma categorização de fontes de aprendizado baseada em quatro tipos: Conteúdos (C), Experiências (E), Pessoas (P) e Redes (R). O CEP+R é uma forma de perceber o quanto a (auto)educação pode ir além do conteúdo e englobar outras maneiras de construção e desconstrução de conhecimento. O(a) educador(a) autodirigido, ao tomar consciência do caráter interativo da aprendizagem e da infinidade de caminhos pelos quais ela pode fluir, começa a criar pontes entre quem aprende e possíveis oportunidades de aprendizado conectadas com os interesses do(a) aprendiz.

Apresentar uma pessoa, recomendar um livro, ajudar a planejar uma visita técnica e sugerir a criação de (ou a entrada em) um grupo de estudos são exemplos de como podemos atuar como conectores no processo de aprendizagem de alguém, preservando sua autonomia.

Construir pontes, além de representar a conexão com novas oportunidades, também significa ajudar quem aprende a viabilizá-las. Sempre é possível que uma pessoa aprenda algo, mas há inúmeros caminhos que ela pode escolher ou criar para realizar esse desejo. Se alguém quer aprender sobre robótica, mas o curso é caríssimo, a educadora ou o educador autodirigido pode ajudar cocriando estratégias para “hackear” o aprendizado (por exemplo, mapear espaços públicos que possuem os materiais e equipamentos necessários ou ir atrás de pessoas que poderiam ofertar mentoria no assunto) e, ainda, pensando junto de que formas alternativas seria possível acessar o curso (arrecadando recursos a partir de uma campanha de crowdfunding ou negociando uma bolsa em troca de algo de valor que possa ser oferecido).

Let’s get crazy about how you can learn this…

Para saber mais

3. Companheiro(a) de jornada

Atitudes fundamentais: estar disponível, provocar e estar aberto à reflexão, cocriar

Fonte: rawpixel.com.

Percursos de aprendizagem livres podem ser solitários. Não raro, nossas lembranças mais queridas do tempo de escola ou universidade são relacionadas às pessoas que conhecemos nesses espaços, ainda que nossa liberdade para aprender fosse tolhida. Imagine, então, conciliar companhia com autonomia. É poderoso.

O(a) educador(a) autodirigido pode ser uma companheira de jornada para alguém se cultivar interesses de investigação semelhantes aos do(a) aprendiz. Nesse caso, ambos(as) vibrarão com cada nova pergunta e cada nova descoberta e irão naturalmente cocriar. Se os interesses forem diferentes, o(a) educador(a) autodirigido assume um papel distinto e pode estimular o(a) aprendiz a encontrar suas próprias companhias de jornada. Não quero com isso dizer que não há possibilidade de companheirismo caso os interesses sejam divergentes. Mas, por haver magia quando as vontades se encontram, acredito que o(a) educador(a) deve estimular quem aprende a criar uma espécie de rede de parceiros(as) que partilham de buscas sinérgicas. Uma rede pessoal de aprendizagem.

Um companheiro(a) de jornada é alguém que está disponível quando queremos trocar ideias, responder a uma dúvida ou ser escutado(a). A gente vai sendo alimentado por esse fluxo e percebemos que nossa jornada importa também para outras pessoas. Sentimos pertencimento.

Outra possibilidade que um companheiro(a) de jornada nos traz é refletir a respeito do nosso processo. A reflexão pode ser potencializada por meio de perguntas generativas e escuta profunda. Quem partilha da jornada com a gente está em ótima posição para nos ajudar a refletir, dado que vive uma experiência análoga à nossa.

Para saber mais

4. Cartógrafo(a) de sonhos

Atitudes fundamentais: clarear, mapear, ajudar a estruturar

Fonte: slon_dot_pics.

De maneira simplista, cartógrafo(a) é quem produz mapas. Sempre digo que todo sonho requer um percurso de aprendizagem. E, ainda que você possa se lançar nesse percurso sem bússola nem mapa, é interessante se orientar e reorientar de tempos em tempos. O(a) educador(a) autodirigido pode ajudar nesse processo.

Aprendizagem é viajar pelo (e rumo ao) desconhecido. Se por um lado é importante entender que o mapa não é o território, ele ajuda a gente a chegar lá. É muito comum termos um sonho, uma visão potente sobre algo que pode acontecer no futuro, mas não conseguirmos enxergar com clareza quais são os componentes desse sonho e os passos para realizá-lo. Algumas perguntas úteis para produzir o mapa de um percurso de aprendizagem são:

  • O que me encanta aprender?
  • Qual é o meu ponto de partida (situação atual) e onde gostaria de chegar (situação desejada) em relação ao meus interesses de aprendizagem?
  • Como vai ser quando eu chegar ao meu destino, isto é, aprender o que desejo? Imagine-se lá e descreva a cena em detalhes.
  • Quais são as fontes de aprendizado (CEP+R) que eu poderia acessar? Dentre elas, quais são prioritárias e quais serão as três primeiras que eu vou atrás?
  • Como eu poderia enxergar cada fonte como geradora de novas oportunidades para continuar aprendendo?
  • Que métodos ou formas seriam mais interessantes para acessar essas fontes? Que métodos eu poderia criar?
  • Se meu percurso fosse resultar em um livro, como seria a estrutura de capítulos? O que eu diria na introdução e o que eu gostaria de ver na conclusão? (se você quiser de fato escrever um livro, essa pergunta fará ainda mais sentido)
  • Como eu poderia projetar minha rotina e o ambiente ao meu redor para ser capaz de dar ritmo ao meu percurso?
  • Que “rituais” eu poderia criar para periodicamente incluir no percurso momentos de reflexão, feedback, pausa e apreciação/celebração?
  • Como eu gostaria de “embalar” meus aprendizados para compartilhá-los com o mundo?

Para saber mais

  • A comunidade Open Master’s reuniu propostas de reflexão valiosas para quem quer estruturar percursos de aprendizagem livres em um journal chamado Wayfinder Kit. O material tem dois focos, o Why e o How.

5. Amigo(a) de confiança

Atitudes fundamentais: escutar, acolher, sustentar

Fonte: Kat Jayne.

O que difere esse chapéu do companheiro(a) de jornada é que um amigo(a) de confiança pode muito bem não ter os mesmos interesses de aprendizagem que a gente. Ainda assim, é alguém capaz de escutar nossas miudezas e “dar a real” quando necessário. Um amigo(a) de confiança se interessa pela gente independentemente de se interessar pelas mesmas coisas que nós. Às vezes, precisamos de alguém que seja capaz de ver diferente.

Quando por algum motivo travamos em nosso processo de aprendizagem, estar com um amigo(a) pode ser crucial para reencontrar o fluxo. Pode ser que a razão para o bloqueio não tenha nada a ver com os temas da aprendizagem em si, e sim com outras esferas da vida que necessitam de maior atenção. O amigo(a) acolhe e cuida de diferentes formas, seja com um abraço caloroso, seja com um convite para espairecer. Dessa forma, vai ajudando o aprendiz(a) a se sustentar em seu caminho. Sustentar-se no percurso não significa que não haverá quedas, mas sim que toda vez que eu cair, sei que terei ajuda para me reerguer.

O(a) educador(a) autodirigido pode e deve ser amigo(a) do(a) aprendiz. Não há porque manter uma distância artificial. A confiança nutrida nessa relação de amizade é fundamental para que todos os outros chapéus funcionem. Para que a confiança aconteça, não basta escutar e se interessar por alguém, é preciso também se abrir e compartilhar o que se passa com você. É preciso se vulnerabilizar. Por isso, esse papel requer disponibilidade e presença.

Para saber mais

  • O livro Comunicação não-violenta de Marshall Rosenberg ensina a praticarmos uma escuta compassiva e a nos comunicarmos de forma mais autêntica.

6. Desconstrutor de crenças

Atitudes fundamentais: questionar, ressignificar

Fonte: Miguel Á. Padriñán.

A forma com que cada pessoa interage com o mundo é informada por suas crenças. Não é fácil reconhecê-las e reexaminá-las, e certas crenças podem prejudicar a construção de um percurso de aprendizagem livre. Algumas crenças limitantes no que se refere à autoeducação são:

  • Síndrome do impostor: achar que não é bom o suficiente e que a qualquer momento alguém apontará sua incompetência
  • Fear of missing out (FOMO): receio de estar perdendo algo a todo momento (muito comum em festivais com atividades simultâneas, por exemplo)
  • “Preciso planejar minuciosamente antes de começar”
  • “Não preciso planejar nada, é só confiar no fluxo que tudo vai acontecer”
  • “Preciso acumular diplomas e certificados, senão não terei valor”
  • “Não está bom o suficiente ainda para pedir feedback e/ou compartilhar”
  • “Não vou atrás das pessoas que podem me ajudar por medo de estar incomodando”

Cabe ao(à) educador(a) autodirigido ajudar o(a) aprendiz no reconhecimento dessas e outras crenças. Uma vez identificadas, é importante entender de onde elas vêm, isto é, o que influenciou sua “aquisição” por parte de quem aprende. Por um lado, as crenças são importantes porque nos ajudam a agir no mundo. Por outro, elas formam uma espécie de “casulo” que nos protege da realidade. Certos momentos na vida, geralmente os mais intensos ou incômodos, nos impelem a sentir ou acreditar em algo de maneira fixa, e isso acaba borrando nossa visão em momentos futuros.

Ao identificar crenças limitantes, e acolhendo sua importância, o(a) educador(a) autodirigido e o(a) aprendiz podem engajar-se em um processo de ressignificação (reframing). Ressignificar uma crença é o mesmo que propor perspectivas alternativas que podem contribuir para que a pessoa enxergue a situação de uma forma mais positiva. Contar histórias é uma maneira muito eficaz de provocar ressignificações. Histórias não contém em si uma verdade absoluta, além do fato de as pessoas se verem refletidas nelas e sentirem empatia pelas personagens.

Para saber mais

  • O artigo “Reframing”, de Linda e Charlie Bloom, é uma referência interessante que introduz o tema da ressignificação de crenças.

7. Provocador de espantos

Atitudes fundamentais: apontar, estranhar, ajudar na curadoria

Rubem Alves dizia que a missão do professor não é ensinar coisas, e sim acender a curiosidade de quem aprende. Acender a curiosidade, para ele, é provocar “espantos”. Espantar-se com o mundo é se deixar encantar por ele e partir em uma jornada de investigação e construção de sentido.

No contexto do(a) educador(a) autodirigido, provocar espantos significa apontar ou sugerir fenômenos, fontes, perguntas e outras oportunidades de aprendizagem para o(a) aprendiz. Essas sugestões de caminhos devem se conectar com os interesses de quem aprende e, como o nome já diz, são apenas convites, podendo sempre ser recusados.

Apontar ou sugerir caminhos são estratégias que o(a) educador(a) autodirigido pode utilizar para apoiar o(a) aprendiz na curadoria de sua aprendizagem. Utilizo a palavra curadoria com o significado de selecionar e organizar trajetos de conhecimento de uma maneira que faça sentido para quem aprende. Se hoje somos cada vez mais bombardeados por informação e conteúdo a todo instante, a tarefa de fazer curadoria de aprendizagem torna-se fundamental. O(a) educador(a) autodirigido deve evitar fazer a curadoria pelo(a) aprendiz, e sim fazer com ele(a) e/ou ajudá-lo(a) a criar seu próprio método para tanto.

Provocar espantos também pode remeter a “estranhar” a realidade. Quando eu me permito estranhar algo, eu tomo distância e sou capaz de problematizar, isto é, assumo o lugar de ignorante. Cultivar o não saber é a fonte de todo aprendizado. Só assim eu consigo estabelecer uma conexão viva com o que investigo. Se acho que sei, perco a conexão e entro em devaneios do ego. Espantar-se é deixar a aprendizagem penetrar lá no fundo da nossa alma.

Para saber mais

  • O célebre livro de Paulo Freire, Pedagogia do Oprimido, tem considerações fundamentais a respeito do “estranhamento” do mundo a partir de sua problematização. Páginas 57–69.

8. Designer de comunidades

Atitudes fundamentais: projetar, anfitriar, facilitar

Fonte: Tirachard Kumtanom.

Pode ser que como educador(a) autodirigido você entenda em algum momento que é importante criar um ambiente coletivo de aprendizagem. Uma comunidade que favoreça a construção de vínculos significativos e potencialize conversas profundas e inspiradoras. Um espaço que convida as pessoas a manifestarem a versão mais autêntica de si mesmas, ao mesmo tempo em que reconhecem e contribuem para um propósito comum.

O propósito é a cola que aglutina os(as) integrantes da comunidade. A pergunta básica é: qual a motivação central que nos une? Alguns propósitos que vejo em comunidades de aprendizagem são:

  • Um tema de interesse: comunidades em que todas as pessoas compartilham da vontade de entender mais sobre um assunto, seja mais prático ou teórico.
  • Um “inimigo” comum: os membros entendem que há algo a ser criticado ou combatido e se unem para aprender mais sobre isso, inclusive a respeito de alternativas ao inimigo identificado.
  • A aprendizagem em si: as pessoas se juntam porque cada uma está desenvolvendo um percurso de aprendizagem e, ao habitarem uma comunidade, podem se apoiar, acessar recursos complementares e trocar experiências.
  • Resolução de problemas (comunidades de prática): os membros compartilham do mesmo tema de interesse e utilizam o espaço comum para obter ajuda em seus problemas ou desafios cotidianos. Geralmente são mais ligadas ao contexto profissional.

Alguns elementos de design importantes ao estruturar uma comunidade de aprendizagem são: chamado inicial, rotina periódica de encontros, clareza a respeito dos resultados esperados, como novos membros serão acolhidos, como as decisões que afetam o coletivo serão tomadas, repositório de conhecimento, desafios e projetos individuais e coletivos, interação da comunidade com outras comunidades e com o ambiente externo, dentre outros. O(a) educador(a) autodirigido, ao assumir o papel de designer de comunidade, deve estar atento ao fato de que o design tem o poder de moldar comportamentos e influenciar na cultura, o ativo mais importante de qualquer grupo.

Além do design, o(a) educador(a) autodirigido pode assumir os papéis de anfitriar e facilitar a comunidade. Anfitriar tem a ver com criar um campo em que os membros se sintam acolhidos e seguros para expressarem suas verdades. Tem a ver também com hospitalidade, generosidade e estar a serviço. Facilitar é desenhar e conduzir atividades que ajudem a comunidade a manifestar seu propósito, e eventualmente inclui até mesmo processos para que o grupo entenda que propósito é esse.

Penso que é interessante que essas responsabilidades sejam compartilhadas com as pessoas participantes da comunidade, de modo a agregar uma diversidade maior de visões ao processo.

Para saber mais

9. Fomentador de equilíbrio

Atitudes fundamentais: estar atento, sugerir reajustes, ajudar a cultivar presença

Fonte: pixabay.com.

Precisamos de muita resiliência para persistir em um percurso de aprendizagem livre. O caminho mais fácil e óbvio seria não sair dos contornos da educação formal, ou seja, fazer cursos tradicionais e ser ensinado. É o que boa parte da sociedade espera de nós. O(a) educador(a) autodirigido deve reconhecer que o(a) aprendiz, só de ter a coragem de começar sua jornada, já está ousando desbravar territórios desconhecidos.

Em alguns momentos, porém, o processo se desequilibra. O(a) aprendiz parece não enxergar que sua trajetória está ficando ou teórica demais, ou somente prática. Ou muito planejamento, ou só ação sem pausa para refletir. Ou apenas aprendizagem individual, ou um “esconder-se” em inúmeros momentos coletivos. Ou uma zona de conforto constante, ou desafios assustadores e paralisantes. Ou só conteúdo, ou só pessoas, ou só experiências como fontes de aprendizado. Ou um ritmo excessivamente intenso, ou desânimo e indisciplina. Ou somente uma busca por mais e mais conhecimento, ou apenas desconstrução e reflexões estéreis. Esses e outros desequilíbrios podem prejudicar o percurso do(a) aprendiz e podem ser apontados pelo(a) educador(a).

O equilíbrio a que me refiro não é uma combinação perfeita dos pólos, e sim uma “dança” entre eles. É um equilíbrio dinâmico. Ora nos aproximamos mais de uma polaridade, ora de outra, cuidando para não ficarmos travados no mesmo lugar. Momentos de desânimo, por exemplo, são naturais. Eles vão acontecer. O que podemos fazer é abraçar o desânimo, encará-lo de frente e dançar com ele. Uma hora eu deixo ele me conduzir, outra hora eu o conduzo e, ao fazer isso, abro espaço para poder me movimentar em direção ao pólo oposto.

Além de se atentar aos possíveis desequilíbrios durante o percurso, o(a) educador(a) autodirigido pode ajudar o(a) aprendiz a cultivar um estado de presença e conexão. Assim, quem aprende será capaz de ampliar sua percepção a respeito de seu processo e recalibrar a rota se necessário. Práticas de respiração e meditação, autocompaixão e inteligência emocional e social podem ser úteis aqui. Trata-se de fortalecer o autoconhecimento e também a “autoignorância” do(a) aprendiz, entendendo a segunda como a possibilidade sempre presente de se surpreender consigo mesmo(a) e se transformar. É por meio da ignorância que aprendemos.

Para saber mais

  • O artigo “Unlocking Human Potential”, da Deloitte, traz uma perspectiva interessante a respeito de como podemos conciliar momentos de pausa e aceleração para potencializar nosso trabalho.
  • O livro Doutorado informal, nas páginas 293–302, apresenta em mais detalhes alguns equilíbrios importantes no contexto de percursos de aprendizagem.

10. Mestre-aprendiz

Atitudes fundamentais: inspirar, aprender, refletir

O olhar da complexidade nos convida a admitir paradoxos e ambiguidades que pareceriam loucura aos olhos da mente linear racionalizante. Essa é a lente que torna possível a criação da figura do “mestre-aprendiz”, isto é, alguém que se coloca ao mesmo tempo no lugar de quem inspira, compartilha e dá fôlego, e também na posição de quem é inspirado, recebe e desbrava os próprios caminhos.

O que seria de um verdadeiro mestre se ele não se dispusesse a ser um eterno aprendiz? É essa disponibilidade humilde de continuar aprendendo e se surpreendendo com a vida que conecta, que inspira, que causa admiração. O mestre-aprendiz, portanto, inspira pelo exemplo ao conservar uma atitude aberta e curiosa mesmo já tendo trilhado um extenso caminho de construção de conhecimento.

Para que isso aconteça, o mestre-aprendiz precisa se manter conectado com o que lhe fascina, isto é, ele precisa continuar abastecendo sua curiosidade. Se ele interrompe o aprendizado em sua própria vida, se ele bloqueia ou deixa bloquearem seus percursos de aprendizagem, a empatia que ele antes era capaz de sentir por outros aprendizes é perdida.

Uma parte fundamental desse caminho de aprendizado que o mestre-aprendiz não pode parar de trilhar é a atitude reflexiva. Em toda sua prática e em todas as suas relações, o mestre-aprendiz se pergunta: “o que minha mente, minhas emoções, meu corpo e minhas vontades e não vontades estão querendo me dizer?” A reflexão, no caso, é uma virtude de todo o corpo, e não apenas da mente. É uma escuta apurada sobre o mundo a partir do que se passa no nosso mundo interno.

Para saber mais

Este texto foi criado com o apoio de muitas pessoas queridas que colaboraram com comentários em um post meu no Facebook. É pra vocês ;)

Saiba mais sobre o que faço em www.alexbretas.com.

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Alex Bretas

Alex Bretas é escritor, palestrante e fundador do Mol, a maior comunidade de aprendizagem autodirigida do Brasil. Saiba mais em www.alexbretas.com.