O que é capaz de mudar uma cultura? Aprendizagem.

Alex Bretas
3 min readApr 16, 2018

O ser humano é um ser que resiste à mudança por conta do conjunto de hábitos e crenças no qual foi sendo “acondicionado” desde que nasceu. Nós reproduzimos a cultura na qual nos criamos e raramente tomamos distância para enxergar o quanto isso influencia nossas vidas.

Percebemos nitidamente, por outro lado, o quanto a mudança é a palavra do momento nas iniciativas sociais. Empresas não só querem, mas sentem que precisam mudar. Escolas, universidades, projetos sociais, partidos políticos entram no mesmo balaio. O mundo volátil, incerto, complexo e ambíguo (VUCA) em que vivemos nos pressiona nesse sentido.

Sair do caldo cultural em que estamos imersos e adotar outras condutas, ou seja, mudar, é custoso para nós porque envolve “dar o braço a torcer”. Admitir que, de certo modo, estávamos fazendo errado. E ninguém gosta de admitir um erro. Dói no ego.

Qual seria, então, o papel da aprendizagem na transformação cultural?

Aprender muda cultura porque envolve primeiro desaprender. “Estranhar” a realidade que nos cerca é o primeiro passo desse processo. Perguntar “porquê” (e depois “e se”, e depois “como”), questionar, chacoalhar o que está posto perante nossos olhos e ver o que está por trás. Procurar enxergar os mesmos fenômenos sob diferentes perspectivas.

Se tentarmos mudar uma cultura na qual vivemos, seja a da organização que trabalhamos ou a da escola da filha, sem nos dedicarmos a um percurso de aprendizagem antes, provavelmente iremos fracassar. Primeiro, porque não conseguiremos criar as questões e os conhecimentos necessários à mudança de mentalidade. Segundo, porque mudar dói, e tentar mudar sem ter nenhum tempo de arejamento prévio assusta demais.

Esse tempo de arejamento, uma espécie de casulo que enseja transformação, é o tempo necessário para que nossa mente e nosso corpo se acalmem e se permitam acomodar novas compreensões. Quando nos deparamos com uma visão que destoa muito dos padrões com os quais nos identificamos, o corpo aciona o modo “luta ou fuga”. Uma descarga de adrenalina nos acomete involuntariamente. Não é fácil lidar com isso.

Assim, pensando em termos de mudança de cultura, criar uma jornada de investigação coletiva torna-se uma estratégia para permitir às pessoas o tempo necessário para “admitir que estavam erradas”. Entre aspas porque, de fato, elas não estavam erradas, dado que apenas viviam naquele momento a sua verdade. Mas se queremos aprender, nossas verdades precisam estar em constante mutação. Esse percurso de aprendizagem seria, então, equivalente à criação de uma “realidade paralela” e, nela, sou capaz de apreciar não apenas o diferente que emana das outras pessoas, mas também de mim, mutável que sou. Algo fundamental nesse processo é a adoção de uma postura baseada no diálogo, isto é, um tipo de conversação que promove entendimentos profundos, e não concordâncias/discordâncias rasas.

Se eu sou professor de uma escola e desejo que ela se torne uma escola inovadora, eu poderia convidar outras pessoas que vivenciam a mesma realidade (outros professores e professoras da escola, estudantes, diretoria) para criar um grupo de estudos sobre inovação educacional, por exemplo.

Num primeiro momento, o grupo ainda não se comprometeria com nenhuma mudança concreta. Isso é essencial para que haja tempo de arejamento. A única tarefa das pessoas participantes no início seria refletir, pensar criticamente suas práticas e as visões de mundo que estão por trás delas, considerar o que outros lugares têm feito e o que diferentes autores dizem. Com o tempo, poderiam começar a experimentar mudanças. Sempre partindo da ideia de que tudo é beta, tudo é teste, tudo é aprendizado. Afinal, o pior que pode vir a acontecer é precisar mudar de novo. E aí ninguém já terá tanto medo da mudança.

A Escola da Ponte, por exemplo, tornou-se o que é hoje exatamente dessa forma.

Se, por um lado, a aprendizagem é essencial para propiciar mudança de cultura, por outro ela não pode parar depois que a mudança acontece. O processo é contínuo. O grupo de estudos não pode morrer depois que as pessoas da escola estiverem satisfeitas com o que criaram. Ação e reflexão andam juntas.

E para você, o que é capaz de mudar uma cultura?

Para saber mais sobre mim, acesse o site www.alexbretas.com.

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Alex Bretas

Alex Bretas é escritor, palestrante e fundador do Mol, a maior comunidade de aprendizagem autodirigida do Brasil. Saiba mais em www.alexbretas.com.